sexta-feira, 4 de maio de 2018

EVOLUÇÃO DAS CIÊNCIAS FARMACÊUTICAS




O ANIMAL QUE TOMA MEDICAMENTOS


Entre as diversas características únicas do Homo Sapiens, encontra-se a propensão dele em tratar os males, físicos e mortais, com medicamentos.

Os medicamentos raramente ocorrem na natureza na sua forma mais útil ( ou palatável). Primeiro, os ingredientes ativos ou as drogas precisam ser colhidos, processados e preparados para a incorporação nos medicamentos. Essa atividade, realizada desde os primórdios da humanidade, ainda é o foco central da práticas da farmácia.

Como ocorre com outras ferramentes, as drogas tem sido utilizadas para conseguirmos exercer maior controle sobre nossa vida, torná-la melhor e mais longa.


Em toda a História, as drogas têm provocado especial fascinação. Além das histórias sensacionais da participação das drogas na exploração, comércio, intriga política, descoberta científica e arte, ocorre a influencia direta na vida de milhares de pessoas.

A FARMÁCIA PRÉ-HISTÓRIA


Desde o passado mais remoto da humanidade, a farmácia tem feito parte da vida diária. As escavações de algumas colonizações mais antigas da humanidade, como Shanidar (cerca de 30.000 a.C.), apóiam a controvérsia de que os povos pré-históricos colhiam plantas com fins medicinais. Por meio de tentativa e erro, cresceu o conhecimento popular sobre as propriedades curativas de certas substâncias naturais.

O reconhecimento das plantas medicinais, algumas vezes utilizadas como alimentos, temperos ou feitiços, aparentemente estava tão disseminado que retardou qualquer necessidade de uma classe especial de colhedores e mantenedores de drogas. A arte da farmácia primitiva provavelmente era dominada por todos que praticavam a medicina doméstica.

As poções mágicas para curar eram parte da responsabilidade do xamã. Geralmente responsável por todas ou a maior parte das coisas sobrenaturais em uma tribo, o xamã diagnosticava (e tratava) a maioria das doenças sérias ou crônicas

Embora os povos mais antigos descobrissem apenas um pequeno número de drogas eficazes, o conceito de influenciar funções corpóreas por meio de uma força externa deve ser considerado um dos maiores avanços da humanidade. O desenvolvimento posterior desse conceito precisou do ambiente da civilização. Para florescer, a terapia médica racional precisava das ferramentas fornecidas pelas culturas estabelecidas – escrita, sistemas de troca bem como de pesos e medidas. Povos tribais contemporâneos, como os tasadays, demonstram que, sem as ferramentas mais avançadas as práticas farmacêuticas não progridem.


ANTIGUIDADE


À medida que homens e mulheres aprendiam a maneira de controlar características da natureza por meio de cultivo, teto permanente e projetos de construção de larga escala, os poderes dos deuses na vida diária começaram a diminuir.

Entre os remanescentes das grandes civilizações, Mesopotâmia e Egito, bolcos de barro e papiros documentam o começo do uso racional das drogas no Ocidente.

Os textos médicos egípcios, como os da Babilônia, mostram uma conexão íntima entre a cura sobrenatural e a empírica. Em geral, as receitas sugeridas começavam com uma oração ou um encantamento. Drogas vegetais, das quais dos laxativos e enemas eram as mais proeminentes, constituíam o principal veículo do poder de cura.

Nos registros mais antigos da Roma antiga, encontra-se um conceito ambíguo semelhante de droga ou pharmakon, palavra que significa encanto médico, remédio ou veneno.

A tradição racional dentro da medicina grega, que se encontrava evidente na obra de Homero, foi refinada e codificada no corpo da literatura ligada ao nome de Hipócrates de Cós (cerca de 425 ª C.). Através da construção sobre as fundações deixadas por filósofos naturais anteriores, como Tales (cerca de 590 ª C.) e Empédocles (cerca de 450 ª C.), Parmênides (cerca de 470 A.C.) e Empédocles (cerca de 450 A.C.), os escritores hipocráticos estruturaram uma explicação racional da doença.

O médico Grego (iatros) treinado, que seguia o método hipocrático, favoreceu os ajustes na dieta e estilo de vida sobre o uso dos medicamentos.

A maior parte dos remédios gregos era preparada a partir de plantas, e o primeiro grande estudo sobre plantas no Ocidente foi realizado por Teofrasto (cerca de 370-285 ª C.), um discípulo de Aristóteles. Seu exemplo de combinar informações de acadêmicos, parteiras, cavadores de raízes e médicos viajantes foi excedido 300 anos depois por Dioscórides (cerca de 65 d. C.) médico grego que redigiu um resumo sobre o conhecimento dos medicamentos de sua época, a Matéria Médica.

Através dos ensinamentos e dos escritos de Galeano, um médico grego que trabalhou em Roma no século II d. C., o sistema humoral da medicina dominou os 1500 anos seguintes.

Além da prática questionável do sangramento, Galeno defendeu o uso de preparados polifarmacêuticos (denominado, atualmente, “prescrições shotgun”, isto é panacéia), argumentando que o corpo do paciente tirava de uma prescrição complexa as substâncias de que necessitava para restaurar o seu equilíbrio humoral.

IDADE MÉDIA


A utilização de drogas para tratar doenças sofreu um outro desvio, quando templos pagãos, alguns dos quais tinham operado usando métodos de cura greco-romanos, foram fechados. A terapia racional com drogas declinou no Ocidente, sendo substituída pelo ensinamento da Igreja de que pecado e doença estavam intimamente relacionados. O culto dos santos curadores, como Cosme e Damião, exemplifica essa atitude.

À medida que a Europa Ocidental se esforçava, surgiu uma nova civilização entre os que seguiram os ensinamentos de Maomé (570-632). Os povos anteriormente nômades, que se uniram e se tranformaram na nações do Islã, conquistaram enormes áreas do Oriete Médio e da África, finalmente expandindo-os para a Espanha, Sicília e Europa Oriental. Como sua fé os ensinava a respeitar a palavra escrita e aos que a estudavam, esses povos toleraram a sabedoria dos partidários do Cristinismo que haviam sofrido perseguição no Império Romano Oriental.

Entre as nações islâmicas, os escritos gregos, inclusive os que tratavam de medicina, foram traduzidos para o árabe. Primeiramente os árabes aceitaram a autoridade dos escritos médicos gregos complemente, eme especial aqueles de Galeno e de Dioscórides. Mas, à medida que sua sofisticação crescia, os homens islâmicos que tratavam a medicina, como Rhazes (860-932) e Avicena (980-1063), acrescentaram idéias nos escritos dos gregos. Os postos avançados de comércio, muito distantes, dos árabes conquistadores também trouxeram novas drogas e condimentos para os centros de aprendizado.

Os remédios novos e mais sofisticados exigiam preparação elaborada. Na cidade cosmopolita de Bagdá do século IX, este trabalho era realizado por especialistas, os profissionais ancestrais dos farmacêuticos de hoje. Em certos locais, como a Espanha e o sul da Itália, onde o mundo islâmico interagiu mais com a Europa Ocidental em recuperação, várias instituições e desenvolvimentos da cultura árabe mais intensamente aperfeiçoada – como a separação entre farmácia e medicina – passaram para o Ocidente.

A cultura árabe levou de volta à Europa o conhecimento científico e médico clássicos.


A RENASCENÇA E O INÍCIO DA EUROPA MODERNA


Em 1453, Constamtinopla (Istambul) foi conquistada pelos turcos, e o remanescente da comunidade acadêmica graga fungiu pra o Ocidente, carregando seus livros e conhecimentos. Mais ou menos na mesma época, Johann Gutemberg iniciou a impressão como o tipo móvel, começando uma revolução na informação.

Com relação a farmácia, a tipografia exerceu um efeito profundo sobre o estudo das drogas oriundas de plantas, porque as ilustrações das plantas podiam ser reproduzidas com facilidade. Botânicos médicos, como Otto Brunfels (1500-1534), Leonhart Fuchs (1501-1566) e John Gerard (1545-1612), ilustraram suas obras com versões realistas de plantas, permitindo aos leitores realizar um trabalho sério no campo ou encontrar drogas necessárias à sua prática.

Paracelso foi o mais importante defensor das drogas preparadas quimicamente a partir de plantas e de substâncias minerais, embora acreditasse firmemente que a colheita dessas substâncias deveria ser determinada pela astrologia.

Processos químicos, especialmente a destilação, deram poderes aos seguidores de Paracelso, visando isolar os princípios de cura de uma droga, sua quintessencia. Com o passar do tempo, a eficácia de algumas dessas drogas se tornou conhecida, entrou na prática médica profissional e apareceu em livros de medicamentos. Dessa forma, houve um grande salto na história da farmácia, o preparo de medicamentos, quando um instrumento da ciência – a química – foi adotada para fabricar uma das ferramentas mais antigas da humanidade, as drogas.

Muito do estímulo às primeiras pesquisas decorreu da descoberta de drogas nas terras recém-exploradas.

A casca de cinchona, da qual foi extraída a quinina em 1820, foi primeiramente para a Europa em cerca de 1640, o que criou uma crise dentro da medicina acadêmica. O sistema de Galeno de equilibrar os líquidos orgânicos, utilizando drogas de qualidade opostas, não explicava a eficácia da casca de cinchona contra a malária. Não apenas a casca curava as febres de malária, como também tinha algum efeito sobre outras febres. Ali havia alguma coisa que Galeno afirmava que não poderia existir – um remédio específico para cada doença.

Durante a época da desordem na farmácia, enquanto os seguidores de Paracelso e Galeno discutiam, o ramo da farmácia estabeleceu as fundações legais e científicas da profissão moderna. Do complexo medieval de associações no continente europeu, cresceram organizações que representavam a farmácia.

A cooperação entre as associações farmacêuticas e os organismos governamentais também levou à padronização dos medicamentos por meio da publicação de livros denominados pharmacopéias.

As descobertas aconteceram gradualmente, através da pesquisa baseada em tentativa e erro, até o final do século XVIII quando Scheele, por exemplo, extraiu vários ácidos de plantas, inclusive o ácido nítrico (1784). O fenômeno individual mais importante ocorreu durante a primeira década do século XVIII, quando o farmacêutico Friedrich Serturner extraiu a morfina do ópio em estado bruto.

Essas drogas novas e puras não apenas foram logo adotadas pelos médicos por causa da sua potência assegurada, como também a sua existência permitiu que os fisiologistas administrassem drogas de forma precisa durante sua pesquisa, o que se tornou a fonte da farmacologia moderna.

FARMÁCIA NORTE-AMERICANA


Quando colonizadores foram para as costas da América do Norte, havia pouco que atraísse o pessoal médico treinado ou estabelecido. De modo diferente das Américas Central e do Sul, não havia tesouros a serem confiscados ou especiarias a exportar. Aquela seria uma terra para o trabalho pesado, e não para espoliação.

À medida que as colônias ficavam mais prósperas durante o início do século XVIII, homens de negócios ambiciosos da Inglaterra eram atraídos, inclusive os boticários. No Novo Mundo, os boticários britânicos continuaram a combinar as práticas farmacêuticas e médica, trabalhando para o grande segmento do público que não podia pagar pelos serviços médicos treinados em universidades.

A guerra contra a Inglaterra interrompeu o comércio com os maiores fornecedores de drogas e medicamentos para os Estados Unidos. Diferentemente das medidas substitutivas usadas durante a Guerra Revolucionária, para suprir as necessidades militares e domésticas durante a guerra de 1812, o comércio norte-americano de drogas desenvolveu seus próprios recursos para o fabrico de produtos farmacêuticos básicos, incluindo os medicamentos patenteados. Quando a paz voltou, algumas firmas norte-americanas sustaram a produção sob pressão inglesa, porém outras continuaram, formando a base para a futura indústria norte-americana de drogas.

Os anos seguintes à guerra de 1812 foram de transição. Mais e mais médicos obtiveram sua experiência clínica em hospitais e dispensários, em vez de fazê-lo com preceptores, aprendendo a prescrever, e não manipular as prescrições. Após a graduação, alguns desses jovens médicos continuaram a escrever as prescrições, estimulando assim o crescimento da farmácia. À medida que os médicos começaram a fazer prescrições para os boticários prepará-las, cresceu a preocupação acerca da habilidade com a qual esses medicamentos estavam sendo manipulados.


TRANSIÇÃO PARA UMA PROFISSÃO MODERNA





A pesquisa industrial das drogas produziu vários agentes novos, como a aspirina analgésica e antipirética, ou o sedativo hidrato de cloral, que reduziram a dor e o sofrimento decorrentes de doença. Embora as farmácias funcionassem como pontos de vendas importantes para soros, antitoxinas e vacinas, a maior parte dos medicamentos manipulados ou vendidos pelas farmácias perto da virada do século aliviava os sintomas em vez de tratar a causa da doença.

Foi durante esses anos que os farmacêuticos finalmente abandonaram a fabricação dos ingredientes das suas prescrições dentro da loja. A indústria farmacêutica havia progredido até o ponto em que poderia fabricar seus preparados básicos de drogas não-refinadas de modo mais barato e mais confiável do que conseguiria o profissional individualmente.

As credenciais de profissional dos farmacêuticos norte-americanos tornaram-se mais fortes em 1932, quando um grau de bacharelado de quatro anos se tornou padrão para licenciamento. Durante as três décadas seguintes, as escolas de farmácia formaram farmacêuticos que poderiam reivindicar o papel de boticários da esquina. Porém. Ao mesmo tempo em que a profissão alcançava o objetivo de uma força-tarefa cientificamente treinada e capaz de realizar todas as etapas envolvidas na fabricação de medicamentos, a tecnologia da indústria farmacêutica assumiu essa responsabilidade.

A ERA DO PINGAR E CONTAR


O terço médio do século XX foi uma época de grande alterações para todos os cuidados médicos, inclusive a farmácia. Na terapêutica, muitos dos grandes flagelos da humanidade foram debelados através da introdução dos antibióticos.

Novas classes de agentes terapêuticos, como os corticosteróides, tranquilizantes, antidepressivos, anti-hipertensivos, isótopos radioativos, contraceptivos orais. A farmácia, que havia trabalhado como um posto avançado para alívio do sofrimento e o tratamento de males menores, passou a dominar a prevenção e a cura das doenças sérias.

O SURGIMENTO DA FARMÁCIA CLÍNICA


O conceito de farmácia clínica surgiu de uma combinação de fatores, como o desenvolvimento da subdisciplina da farmácia hospitalar desde os anos 20 do século XX, o crescimento da farmacologia clínica a partir dos anos 40 do referido século, programas de ensino inovadores e o declínio da instrução de farmacologia nas escolas médicas.



Durante o século XIX, a ciência médica ultrapassou a compreensão do público acerca da fisiologia da doença. O conceito de como instrumento da medicina funciona, uma vez compartilhado tanto pelo médico quanto pelo paciente, havia sido perdido. A confiança do público nos profissionais médicos subsequente diminuiu. Conforme pesquisas recentes demonstram, os farmacêuticos, compartilhando ideias acerca de mecanismos de ação dos medicamentos, tornaram-se os profissionais em que a sociedade norte-americana mais confia.






Fonte: Remington. A Ciência e prática da Farmácia.  2004 20ª ED. Editora Guanabara Koogan S.A.